de há uns tempos para cá, a mimosa começou a intrigar-nos com as suas ausências: começaram por ser de um ou dois dias, alturas houve em que duraram quase uma semana... a Humana, ralada, percorria os locais próximos, tentando encontrá-la, interrogava a vizinhança, para saber se alguém estaria a alimentar uma gatinha que correspondesse à descrição que ela fazia da minha irmã... sempre respostas negativas! um certo fim de tarde, a mimosa, depois de uma ausência de cinco dias, esperou, no alpendre, que a Humana chegasse e lhe desse comida e as festinhas habituais. vimo-la afastar-se, depois, e passaram-se quase três meses sem que voltássemos a vê-la. “se ela, quando aparece, vem gordinha e lustrosa, é porque alguém a anda a alimentar” – dizia-nos a Humana. “e, embora com pena minha, ela fez a sua escolha”.
há cerca de quinze dias, quando a Humana vinha a subir a rua paralela à nossa, ouviu a mimosa a chamá-la!!! encaminharam-se, ambas muito alegres, para casa, trocando miados, palavras e mimos. foi uma enorme surpresa para todos. a brunildinha ainda hoje comenta: “quando a vi, até fiquei branca!”. diz ela que a julgava morta e, por isso, pensou que era um fantasma que nos entrava pela porta dentro, o que nos iria, certamente, trazer alguns problemas. só para tirar dúvidas, deu-lhe logo umas unhadas, verificando que, afinal, havia carne, e bastante, sob o pêlo.
finalmente, a mimosa explicou-nos a razão do seu desaparecimento:
andava eu a perseguir lagartos, no terreno do vizinho, quando me aparece um gato muito garboso, a miar com sotaque esquisito.
“olah, prrinzeza! jamo-me manfred mach podech trratarr-me porr manni. quê dizech a virr darr uma voltinha na minha companhiah?”
a mimosa aceitou o convite; e não tardou que ambos estivessem caídos de amores um pelo outro. veio a saber, depois, que ele a tinha achado muito parecida com a gata que aparece no saco de rações coshida.
“ eh um verrdadeirro zex-zimbol; no meu páich, todoch och gatos adultoch zonham terr uma aventurra sexzual com elah.” e, logo de seguida, perguntou-lhe: “oh mimozah, querrech juntarr os trrapinhos cômigo? já nos conhezemoch ah tempo zufiziente parra eu perrceber qué eh contigo qué eu querro viverr ateh ao fim doch meuch diach”.
e assim, juntos e felizes, passaram três meses das suas vidas. até que um dia, vislumbrando um rato anafado do outro lado da rua, manfred lançou-se, como uma flecha, no seu encalce, sem reparar num desses rapazes que fazem entregas para a pizza hut, a descer a rua, na sua vespa...
o que se seguiu foi verdadeiramente lamentável: manfred estendido, sem vida, no passeio, uma pizza familiar de cogumelos com ananás e cinco embalagens de profiteroles espalhadas no asfalto, o rapaz a praguejar...
a mimosa deitou-se, tristíssima, no cesto que, tantas vezes, partilhara com o seu amado manni. o desgosto afectou-lhe a memória: não conseguia, por mais que tentasse, encontrar o caminho para a sua antiga casa. então , poucos dias depois, viu a Humana a subir a rua e.... o resto já vocês sabem.