fevereiro 16, 2010

ouvi dizer que hoje é carnaval e tenho estado atenta, a ver quando é que a Humana, que saiu há pouco, nos bate à porta, vestida, tal qual a deusa diana,  com uma túnica leve e  esvoaçante  e acompanhada pelo cão lost, ornamentado com umas enormes hastes, representando o curioso caçador acteão, que a deusa transformou em veado.
infelizmente, eles acabaram de chegar e eram os mesmos que daqui saíram, ou seja: a Humana e o cão lost, este último a abanar a cauda, a Humana a dizer mal do frio e da chuva e de não sei que mais e, quando lhe perguntámos de que é que ela se ia mascarar, ela respondeu-nos que, com o péssimo humor com que hoje se encontrava, o mais certo era personificar o sweeney todd, o terrível barbeiro de elm street, e esperar as visitas com o seu estojo de navalhas bem afiadas.

fiz um sinal discreto à brunildinha, para nos retirarmos, antes que a coisa azedasse e, à falta de melhor forma de passar o tempo, entretivemo-nos a ver algumas fotos que a Humana guarda no seu arquivo "passeios".













brunilde - ó idun, o que é isto? será que a Humana fotografou um ovo estrelado e um pão, que levou para um passeio?
idun (risos) - não, brunildinha. é uma foto de uma pedra. a Humana diz que são raras e que, no dizer do povo, são "pedras que geram pedras". há aqui mais fotos, queres ver?
cá estão os nódulos, revestidos por mica: 














idun - e aqui,













podemos ver o nódulo que se irá soltar da pedra-mãe. por isso, em linguagem popular, estas são conhecidas como pedras parideiras.

brunilde - micas? pedras parideiras? mas que interessante! que palavras e que imagens inspiradoras! ó artur, vai buscar o meu bloco-notas, que eu preciso de escrever.
ora, então, cá está uma linda história para eu contar aos visitantes deste jardim:

há muito tempo, lá para os lados da serra da freita, vivia uma bela moçoila , robusta e de boas cores.
chamava-se maria do patrocínio mas todos a tratavam por micas, diminutivo que ela achava simpático e bem adequado ao seu jeito vivo e folgazão.
micas não parava quieta, era vê-la a trabalhar no campo e a dançar nos arraiais, mesmo em casa  era um andar para cá e para lá, dizia ela que tinha qualquer coisa que a não deixava sossegar, um redemoinho, uns calores, uns frenicoques que só lhe passavam castigando o corpo no excesso de trabalho e de dança.
tia remédios, a velha bruxa da aldeia, bem tentou, através de mezinhas  e rezas obscuras, livrá-la do malino que a habitava e lhe provocava tais efeitos. tudo em vão: micas continuava mais mexida que um vira minhoto. e foi precisamente nas voltas de um vira que encontrou sossego temporário: o jofre jeitoso, recém-chegado de orbacém, um lugarejo do concelho de caminha, prometeu um dia ensinar-lhe essa modinha lá da sua terra e para tal arrastou-a para um pé-de-dança só para dois, sob o olhar desinteressado de um velho sobreiro, no entardecer da serra.

ó vira que vira ó vira ó ai
as voltas do vira são boas de dar

em todas as casas, já a luz das candeias se apagara, quando ambos regressaram à aldeia, a micas tomada de uma paz que até ali desconhecera, o jofre caído de amores e a fazer contas à vida pois, se decidido não estivesse a casar com ela, a tal seria obrigado pelos costumes da época.
depois do casório, foi um não mais acabar de trabalho duro e  filharada,  até que a morte, por complicações ocorridas em gravidez na pré-menopausa, roubou à micas as cores, a alegria e o folguedo.

Arquivo de jardinagem

Powered By Blogger